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/ Para Carf, planejamento tributário abusivo não é fraude ou sonegação

Em se tratando de planejamento tributário, ainda que abusivo, não resta caracterizado o dolo apto a ensejar penalidade quando não há ocultação da prática e da intenção final dos negócios levados a efeito.

Com base nesse entendimento, a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) afastou a ocorrência de sonegação ou fraude contra a lei e manteve a condenação de uma empresa ao pagamento da multa comum (75%).

O caso em julgamento foi de infração de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido decorrente da dedução de despesas de amortização de ágio na aquisição de investimento referente aos anos-calendário de 2007, 2008 e 2009 de um grupo econômico multinacional. A exigência foi formalizada com cominação de multa qualificada (150%).

Diante do recurso do contribuinte, o colegiado da 3ª Câmara da 1ª Seção do Carf reduziu a multa de ofício para 75%, argumentando que as condutas que afetam a base de cálculo estão fora do alcance do conceito de fraude fiscal abrangido pelo artigo 72 da Lei 4.502/64, visto que a literalidade do artigo exige que se afete dolosamente a ocorrência do fato gerador ou suas características fundamentais.

Desse modo, pela circunstância de a dedução das despesas de ágio afetar a apuração da base de cálculo, entendeu o colegiado que, ainda que acatando a premissa de ilicitude dessa conduta do contribuinte, verifica-se que ela não atende à condição do artigo 72 da Lei 4.502/64, devendo ser afastada a qualificadora.

O conselheiro relator do recurso especial da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Fernando Brasil de Oliveira Pinto, afirmou que a autuação do grupo econômico se baseou na ausência de propósito negocial na operação levada a efeito com a utilização de “empresa veículo” a fim de viabilizar a amortização do ágio.

Porém, para o relator, a interposição de “empresa veículo” para aquisição do investimento e posterior incorporação reversa a fim de que, de modo artificial, ocorresse a amortização do ágio só poderia ser caracterizada como fraude em hipóteses singulares.

Isso porque, conforme explicou o conselheiro, a evasão se dá após a ocorrência do fato gerador, consistindo em sua ocultação “com o objetivo de não pagar o tributo devido de acordo com a lei”. Já o planejamento tributário abusivo “se restringe ao abuso da possibilidade expressa na lei e dos conceitos jurídicos indeterminados; inicia-se com a manipulação de formas jurídicas lícitas para culminar na ilicitude atípica”.

Em resumo: o planejamento tributário abusivo (elisão abusiva) precede a ocorrência do fato gerador e gera multa comum. A sonegação e a fraude (evasão) dão-se após a ocorrência daquele fato e pressupõem dolo e geram multa qualificada.

No caso concreto, para o relator, a conduta praticada pelo contribuinte enquadra-se no conceito de elisão abusiva, uma vez que as provas coligidas indicam que todos os atos foram praticados antes da ocorrência do fato gerador. Assim, quer se enquadre tal conduta como abuso de direito ou como fraude à lei, não há de se falar em fraude contra a lei de que trata o artigo 72 da Lei nº 4.502/64.

Tanto o abuso de direito quanto a fraude à lei são institutos previstos na lei civil, com características próprias, mas não foram eleitos pelo legislador tributário como razão para qualificação da penalidade.

“Também não há de se falar em sonegação, uma vez que todos os atos foram devidamente declarados à Receita Federal, excluindo-se a possibilidade de ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal”, acrescentou Fernando de Oliveira.

Por fim, ele disse que à época dos fatos geradores em análise a jurisprudência era vacilante acerca da própria amortização do ágio, circunstância que, no mínimo, induzia o contribuinte a fazer manobras desse tipo, colocando em dúvida a existência de dolo do sujeito passivo ao não recolher tributos, aplicando-se ao caso o artigo 112 do CTN para afastar a qualificação da penalidade.

Thais Veiga Shingai, advogada do Mannrich e Vasconcelos Advogados disse ser muito comum nesses casos haver qualificação para multa de ofício. Segundo a especialistas, no caso, a Câmara Superior concluiu que não há questionamento sobre a existência do ágio, mas sobre a estrutura utilizada pelo contribuinte para poder aproveitar aquele ágio. Portanto, não haveria conduta dolosa que justificasse a qualificação da multa.

“As empresas poderão argumentar que o abuso de direito e a fraude à lei — que são geralmente usados como fundamentos nesses autos de infração — são institutos de Direito Civil que não podem embasar a multa qualificada”, pontuou.

Fonte: Associação Paulista de Estudos Tributários